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Eles não veem novelas, se enovelam em novelos humanos; não velam só revelam a novela humana em novenas sacroprofanas. Júlio César de Carval...

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sexta-feira, 23 de março de 2018

O gado humano


          Em fila, corredores climatizados, música ambiente, de preferencia clássicos da música erudita passo lento, aparentemente bem tranquilos, relaxados, um olhando a bunda do outro, melhor, o rabo, depois um banho com hidro, de repente o tiro sônico final ou uma martelada fatal, que antecede a degola; dizem os terapeutas de boi para o abate - isto melhora muito a qualidade da carne, torna-a bem macia; são animais de uma certa estirpe, diferenciados, bem alimentados, peso bom, acima do limite. Vão ser esquartejados até a mínima peça e servidos nas mesas mais caras. 
       O gado humano de fino trato também não esta fugindo dessas características, têm seus terapeutas para mantê-los relaxados nos corredores da redoma, de quatro; quando recebem o tiro fatal e posterior degola que retira o pouco de sangue que ainda resta, pedem que suas partes sejam jogadas nas montanhas, lagos ou pequenos córregos que navegam pelas florestas; reencarnam-se momentaneamente para autografar autobiografias, retornam etereamente. 
      O gado comum continua sendo morto nas pequenas mangas de currais de madeira roliça, um ritual que culmina em uma sangria no pescoço, o abatedor levanta a faca desfere um único golpe e dança, enquanto o animal se debate muito, depois vai morrendo lentamente em cima de um pequeno rio de sangue, cerrando os olhos devagarinho, com aqueles cílios enormes, marcando todos com seu olhar; também vai ser esquartejado ate a mínima peça só que servido nas bancas da periferia. 
        E assim é com a massa do gado humano comum, sem direito a corredores climatizados, musicas para relaxar e abatido vai largando suas partes nas ruelas e becos empoeirados sem direito a biografia. Mas as partes largadas vão marcando paredes com uma tinta difícil de lavar. 
        Abandonar o sulco, sair do facão, do veio, arrebentar com os corredores, começar o dia com o pé esquerdo... É preciso

Júlio César de Carvalho Jota


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